quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

«Em cada chegada, uma partida»...



Completam-se hoje dois anos que nasceu o Amor de Deus repousa em mim... Foram dois anos em que muita coisa mudou em mim e naqueles que foram partilhando o meu caminho. Foi, sobretudo, um tempo de amadurecer as decisões que definem a minha vida e de procurar ser verdadeiro com as escolhas que fui fazendo, diante do projecto que um dia descobri que Deus tinha para mim. Aqui, fui deixando alguns pedaços do que vivi por dentro, entre a alegria e o deslumbramento ante Deus e a vida, as dores de crescimento e as fragilidades que me são próprias... 

Hoje, sei que há um tempo para nascer e um tempo para morrer, um tempo para fazer brilhar a Luz diante de todos e um tempo para experimentá-la, em segredo, no coração e na vida. É por isso que este espaço chega hoje ao fim...

A todos os que foram passando por aqui agradeço as partilhas que fizeram, o que deram de si e me ajudou a crescer, ou simplesmente o silêncio do encontro com Deus... Foi ter-vos a todos por perto... E como em cada chegada há uma partida, espero poder estar convosco em breve, talvez num outro espaço, não muito longe daqui. Por agora, permanecerei em silêncio, descansando sob o olhar amante d'Aquele que um dia me fascinou com o seu jeito de amar e servir....

[O blog ficará online por mais algum tempo, até sair definitivamente de circulação...]

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010



«Ao encontrar o amor de Deus em Cristo, o homem não experimenta apenas o que é verdadeiramente o amor; experimenta ao mesmo tempo de modo irrefutável que ele, o pecador e o egoísta, não tem verdadeiro amor. Experimenta duas coisas numa só: a finitude criatural do amor e o seu empedernimento culpável.

[...]

Mas a partir desta "pré-compreensão" [do que é o amor] ele não chega, sem uma conversão radical, ao reconhecimento deste sinal: conversação do coração que, na presença deste amor, deve confessar que ainda nunca amou; mas conversão também do pensamento que, nesta situação, deve reaprender o que é simplesmente o amor.

[...]

Diante do Crucificado, torna-se manifesto o egoísmo profundo, inclusive, daquilo que nos habituámos a designar como amor; interpelados com seriedade suprema, dizemos não onde Cristo disse sim por amor; e, despreocupadamente, dizemos sem amor que sim, que ele carrega com os nossos pecados: só nos pode convir que ele o faça! Eis porque Deus não exige aos pecadores o seu acordo acerca da Cruz; só aquele que ama é intimado a dizer sim ao que há de mais terrível, a morte do amado

Hans Urs von Balthasar, Só o Amor é digno de Fé

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010


Não é comum parar para olhar a minha existência e descobrir-lhe um sentido radical, ainda que, à partida, julgue já ter feito uma síntese vital. Na verdade, a maioria dos meus dias são experimentados como um contínuo empurrão entre aquilo que devo fazer, dizer, esperar e ser, e a complexidade de relações, acontecimentos, sucessos e fracassos, dúvidas e esperanças que preenchem o meu caminho. Dividir a vida em pequenos compartimentos estanques, distintos e bem definidos e dar a cada um a atenção e cuidado devidos não é uma opção com sentido, na medida em que não me permite perceber-me como um ser uno e total; contudo, é assim que, demasiadas vezes, experimento a existência.

Sem perceber claramente que sou uma totalidade, não chegarei a perceber a medida com que sou amado por Deus, pois não existe amor que não ame a totalidade do amado. Experimentar o amor criador e libertador de Deus somente nos lugares que me parecem dignos de ser amados, apenas nas dimensões que eu ou os outros consideramos autênticas e belas é não saber ser amado.

Hoje, gostava de olhar-me e encontrar uma unidade viva e consciente de receber a vida como um dom, no amor. Enfrentar o presente numa dinâmica centrífuga e dispersante não é a atitude de alguém que quer aderir todo ao desafio da fidelidade. A clarividência com que se descobre os escombros e as ruínas de egoísmo e de morte deixados no coração e na inteligência é certamente o primeiro sinal da exigência evangélica da conversão, mas não basta. É preciso aprender de novo a esperar e a confiar, é preciso a determinação de quem quer sobreviver à clausura dos limites e fragilidades do ser humano, para acolher o advento de um Reino, que ultrapassa radicalmente os sonhos e desejos fúteis e tacanhos.

Preferir o Reino de Deus é, neste mundo, uma opção exigente; preferir o Reino e a sua justiça é colocar-se no último lugar e daí levar a luz do Evangelho à massa desorientada dos homens e mulheres que permanecem inertes nas trevas. Chega a hora, e já é, em que só o Espírito de Deus pode suscitar em mim a coragem de abandonar-me inteiramente à missão que o Senhor quer confiar-me, e a confiança na promessa vitoriosa do amor. Sei-me frágil, radicalmente frágil e impotente perante a escuridão que, por vezes, irrompe nos meus dias e me tolda o olhar, endurecendo o meu coração pobre.

Sei que sou chamado a ser sinal de contradição. Apesar de todas as perseguições, de todos os insultos, de todas as mentiras e traições, de todas as lágrimas e solidão, quero-o e desejo-o, hoje, com todas as energias vitais que fervilham aqui dentro. Não pelas minhas capacidades ou aptidões, não pelos méritos académicos e pelas palavras bonitas que possa dizer, não pelo poder e pela autoridade, não pelas opiniões ou ideias mais ou menos coerentes! Simplesmente, pela minha pobreza e pela graça do Senhor, pois quando sou fraco então é que sou forte… Do meu lugar e do meu tempo, daquilo que sou aceito deixar-me tornar sacramento do Crucificado Ressuscitado, sinal e instrumento do amor misericordioso, da comunhão na unidade, da consolação na compaixão. Não tenho a certeza de ser capaz, mas permaneço certo que Ele será fiel e isso me basta.